sexta-feira, 13 de julho de 2007

DEIXA MEU POVO IR

SÉRIE DISCIPULADO

Por Francisco Nunes

A ordem de Deus a faraó foi muito clara e definitiva: “Deixa ir o Meu povo” (Êx 5.1). Não era um pedido ou uma sugestão; não era um “por favor” ou “com licença”, mas uma ordem do Deus Jeová: “Deixa ir o Meu povo”. E o descumprimento desta ordem resultou na destruição do Egito, na morte do primogênito do governante e na vergonhosa derrota de seu exército.

Esse fato do Antigo Testamento serve-nos de ilustração, alerta e princípio para algumas questões relacionadas também ao discipulado. A Bíblia toda revela que Deus é ciumento de Seu povo. Não é para menos. Em termos do Novo Testamento, o povo de Deus, a Igreja, foi comprado pelo preço do sangue de Jesus Cristo, Deus encarnado, vertido na cruz do Calvário. Aquele que nos fez foi também Aquele que nos comprou de volta para Si mesmo, para sermos propriedade Sua, “a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido” por um alto preço (1Pe 2.9). O Senhor (e é sempre bom lembrar que esse título significa dono, possuidor, amo), por meio de Seu Espírito “que em nós habita tem ciúmes” de nós (Tg 4.5). Ele não admite dividir o amor que Lhe devemos ter com qualquer outro. Como alguém já disse: “Ou Ele é Senhor de tudo ou não é Senhor de nada”.

A saída do Egito bem ilustra isso. Faraó tentou uma via-média com Moisés – e, por conseguinte, com Deus –: o povo podia sacrificar por ali mesmo; o povo podia ir, mas não muito longe; o povo podia ir, mas não todas as pessoas; o povo podia ir, mas não com todos os seus bens (Êx 8.25-28; 10.8-11,24), sem falar das várias vezes em que mentiu que o deixaria partir. Mas Deus não negocia Seus direitos sobre Seu povo. Este povo Lhe pertence e, por isso, Ele estabelece os termos e as condições. E estes são muito claros e simples: é tudo Dele.

O discipulado, sem dúvida, envolve uma grande tentação, uma grande armadilha: a de querermos que aqueles a quem discipulamos apeguem-se a nós. E isso pode facilmente acontecer, quer propositada, quer acidentalmente. O fato de participarmos muito de perto da vida de alguém gera um ambiente de confiança e de dependência que, se mal utilizadas, resultarão em escravidão, abuso espiritual, cegueira e certo tipo de idolatria, quando não pecados morais. Isso decorre do erro primário de entendermos aqueles a quem instruímos como nossos discípulos e não discípulos do Senhor. Os elogios que podemos receber quando eles reconhecem como os ajudamos, as confidências de problemas muito íntimos (especialmente por pessoas do sexo oposto), a confiança quase cega em tudo o que dizemos, a certeza de que sempre teremos a resposta para todas as dúvidas – sejam elas bíblicas, filosóficas, emocionais, profissionais ou de qualquer outra área da vida – todos estes são resultados possíveis do discipulado. Mas são perigosos. São armadilhas. Podem se configurar em tentações para nós, propondo-nos roubar o coração do povo, como fez Absalão em relação a seu pai, Davi (2Sm 15.6).

Podemos aceitar essa situação inocentemente – pelo menos, a princípio –, justificando-nos que aquele frágil discípulo precisa de uma atenção especial, precisa de um acompanhamento mais estreito, pois ele nunca teve ninguém com quem conversar, em quem confiar. Mas, com certeza, se tivermos um relacionamento sério com Deus, seremos alertados interiormente por Seu Espírito de que algo está errado. O povo é do Senhor, pertence a Ele, deve aprender a relacionar-se com Ele, a ouvir Dele, a receber respostas Dele, a confiar Nele, a ser orientado por Ele. Os discipuladores – ou qualquer outro nome que se prefira – devem ser apenas exemplos vivos desse relacionamento estreito com o Senhor, nunca um substituto dele. E, por amor ao Senhor e ao Seu povo, devem fugir de toda possibilidade que esse entendimento errado do discipulado se estabelece, tanto neles mesmos como naqueles a quem orientam.

O povo é do Senhor, e Ele se vingará – a Bíblia claramente ensina que o Senhor toma vingança de todo aquele que tenta se apossar de Seu povo! – de quem quer que Lhe roube o lugar no coração daqueles que Lhe pertencem. Sejam estes quem forem. Tenham feito isso não importando sob qual pretexto. A Grande Comissão prescreve: “Ensinando-os a guardar todas as coisas que Eu vos tenho mandado” (Mt 28.20). A função do discipulado é ensinar, não fazer em lugar de. É ensinar a guardar o que o Senhor ensinou, não o que o discipulador ensinou ou o que ele supõe ser certo. Em outras palavras, o discipulado deve conduzir os filhos de Deus a conhecerem pessoalmente Aquele a Quem pertencem e a se relacionarem diretamente com Ele. Os cristãos devem aprender a pensar por si mesmos, na dependência do Espírito e da Palavra. Devem ser instruídos a orar por si mesmos, por suas necessidades e pelas situações ao seu redor. Devem aprender a verificar tudo o que ouvem pelo imutável padrão das sãs palavras das Escrituras. O povo é do Senhor. E Ele se alegra quando cada membro de Seu Corpo avança para a maturidade dessa forma. E que ninguém ouse pôr a mão no povo comprado pelo sangue.

Fonte: www.eclesia.com.br

Nenhum comentário: